O Viajante Clandestino
José Rodrigues Miguéis
Um dos mais belos contos de todos os
tempos em língua portuguesa tem como cenário Baltimore, a cidade portuária
norte-americana onde viveu e morreu Edgar Allan Poe, e decorre na noite de
Natal. Os tripulantes do cargueiro desembarcaram rapidamente, mas o clandestino
Tomé permaneceu horas no porão, aguardando o momento de saltar para terra.
“Tinha entrevisto na noite, ao chegar ali, os perfis dos barracões do porto,
mais longe fábricas, prédios, o clarão mortiço da cidade. Estava na América, a
dois passos do trabalho e do pão, a um salto do seu destino. E o coração
batia-lhe de anseio.” Tomé acaba por se escapulir do barco rumo à malha urbana.
Mas esbarra com um agente da polícia, bem capaz de lhe cortar as asas ao sonho.
Valeu-lhe o facto inesperado de ser noite de Natal…
À hora a que
milhões de americanos consoavam, no conforto burguês das suas habitações
calafetadas, este português apátrida renascia como cidadão do Novo Mundo no
frio nocturno das ruas inóspitas de Baltimore. Exilado e despojado, como o
menino-deus nazareno: a eterna magia da noite de Natal.
Conto extraído de “Gente de Terceira Classe”
Para ler
on-line:
Antologia do Conto PortuguêsContemporâneo,
selecção, prefácio e notas biobibliográficas de Álvaro Salema, Instituto de
Cultura Portuguesa, 1984.
Sem comentários:
Enviar um comentário