Há
dias feios feios. Olha-se para o céu e não há céu. Vai-se ao mar e o mar está
sujo e a areia está barrenta. Passeia-se e não se vê nada. O nevoeiro tapa as
vistas. Sobressaem só as cores mais vivas dos prédios mais grotescos.
É
um alívio. A beleza também cansa. Faz bem tirar umas férias dela. Repara-se
mais nas pequenas belezas das coisas próximas: as pilhas de livros, as
diferenças entre as nozes, o cheiro da casca de uma laranja.
Não
há distracções. Os livros lêem-se mais depressa. A decisão de ficar em casa é
automaticamente tomada. Poupa-se tempo. Trabalha-se com mais calma. Tem-se mais
juízo. Gasta-se menos gasolina.
Os dias feios são o tempo
em obras. A água da
chuva é essencial para a próxima Primavera e para as primeiras frutas. São
problemas de canalização que estão a ser resolvidos. Há montanhas de areia para
mover.
Se formos passear, os
montes estão cheios de plantas e flores acabadas de nascer. Atrás dos dias
feios há uma Primavera de Janeiro, um ano novo em ervas novas, tudo escondido
pela falta de luz e pelo frio.(…)
Miguel Esteves Cardoso, in Público, 16 de Janeiro de
2014
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